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domingo, 29 de julho de 2018


O causo de causar estranhezas


Eu ordenhei a vaca doente, nem o leite servia, fervia, tinha febre no úbere, precisava de cuidados, era carinho.
A lua branca tem um ninho de cegonha, de onde voam meninos
E eu sem cama e sem luz nesse ninho de serpentes,
Olhos de manhãs salpicados de venenos vespertinos 
Eu vi dois olhos estranhos a vasculharem a estrada, não havia a sensação de nada, mas fiquei intrigado.
Não conto estrelas, não tenho dedos para tanto, mas a vaca mugiu de novo, já abanando o rabo em perdidas direções, já deixando o corpo, flutua.
Vestes longínquas deixam os corpos no gelado, precisei tantos dos teus carinhos nas noites mais frias em que eu dobrava as dobras do mundo, mas o manto de saudade é curto demais para cobrir esperas longas
Recuso-me a expulsar as frequências, a estrada se acomprida se paramos e a alma segue adiante,
A moça também está doente e quer festa, às margem dos meus passos parei e ela sorriu e eu sorri para ela.
Para o peito dorido há tantas dores dispersas de ferir a alma, mas não posso ficar alheio à corrente do mundo, daqui faço parte, sou um pedaço disso tudo...
Era passível de depressão, mas ela sabia o que a engolia, uma grande boca de escuridão a devorar pirilampos,
Ela era miúda feito um grão, semente de girassol presa na cama, quando num dia era a fome e noutro a comida
Parecia um anjo fincado no chão a murchar asas e perder voos e eu queria dizer palavras, mas era ela que me consolava
Eu achava os meus dias ruins, mas ela exalava calmaria nos dias mais tempestuosos, perto dela não havia ventos de soprar velas, nem trevas de se impor à luz.
Falo do que eu acho, nada pode me causar estranhezas ou tudo pode, mas ela sempre sabia mais, parecia que a proximidade da morte abria as janelas da sabedoria, mas eu não queria espiar para dentro, mas ela me falou que precisávamos abrir espaços para novas plantas
Meus olhos regaram chão, mas o brilho dos olhos dela era magia daquilo que está além de nós.
Não havia medos, receios, aos campos ondulados na brisa liberam os sorrisos das flores para ganhar o ar, fertilizar os céus, são mimos que não percebemos, algum deus nascendo de nós
Não faça planos de longos tempos, como quem deseja pautar a vida na sua agenda, a vida se encerra a cada dia, mas no seu sortilégio ela nos faz pensar que acordamos a cada manhã.
Eu no meu egoísmo desejei que ela ficasse, mas ela me disse: A partida pode ser a melhor parte, simplesmente desfarei as insônias e ganharei sonhos eternos. Há jeito mais romântico de ver a lua de perto?
Acho que ela tinha razão em tudo, mas o tudo esconde de nós os detalhes, todas as tardes me posto à janela e vejo perfeitamente os olhos dela a me fazerem companhia. Tudo é eterno ao que nos damos, ao que amamos.
A vaca mugiu comendo flores em algum jardim estranho, as cegonhas voaram para fazerem as entregas, esfrego os olhos molhados de insônias, não podemos morrer todos os dias, mas podemos fazer nossa parte.
A felicidade, às vezes, tem olhos estranhos e coisas estranhas, às vezes nos parecem tão belas.







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