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sábado, 29 de setembro de 2018



Difícil é regressar
sobretudo quando o velho cão ladra para espantar o passado
e quando dos pássaros as asas aportam sobre as frases feitas e bicam as palavras ditas sem a emoção necessária
e sobrevoam a casa com as ironias das dúvidas,
A sinceridade não é flor cega, mas os teus olhos e os meus olhos
vão em busca de amor
Quando a beleza parece intocável,
Toque, então, sem força as pétalas, não as sufoque tanto,
Sinta com os toques sensíveis a textura da perfeição,
E por onde havia arames farpados e espinhos fizemos das cercas livres caminhos
É o regresso chamou de bem vindo o teu sorriso
Por onde havia frestas por todos os lados, o vento se acomodou em tom suave e contou histórias novas

Charles Burck






Por que ainda agarro as memórias de alguém que vive dentro de mim?
E qual o tom que os músculos encerram nos ensaios da dor que os inflama?
E a pele que vibra à passagem do tatear das tuas mãos ausentes
Os ouvidos demasiados longe ensaiam canções só nossas,
todos os dias eu te toco,
sem tocar
 esse mesmo mistério atravessa de novo a fronteira do olhar, 
 e espanta tudo o que me mete medo. 
Eu que não aprendi a falar, escrevo, dou voz a minha boca pelas letras,
Assim vou falando de ti, até que me leias


Charles Burck





Os deuses nos exigem tanto de amor quanto de dor,
Desvendar de dentro o labirinto,
Sabe reconhecer o que somos, o corpo, lambendo a cria,
A língua amplia o desconforto, somos,
Sempre temos notícias de nós,
Desamarrei as velas, naveguei ventos internos, beijei sereias
E fundeei o barco no porto de algum canto escuro,
Fomos, navegando tanto e pelo visto nem mesmo saímos de dentro de nós


Charles Burck



Bruce Holwerda 


Eu poderia dizer que era amor, mas como falar de algo para quem nunca sentiu sacudir a casa?

E os ruídos do coração desassossegado desfazendo as estrutura convencionadas,
Diante de mim, dentro dos olhos vimos idênticos sonhos,
Acertar-te comigo antes mesmo de deitar-me sobre o teu corpo
A tua roupa interior tecida com a minha pele,
Fala de tudo o que o amor não nos conta
A casa estremece, balança
E as palavras se organizam tentando traduzir tudo,
Saídas dos beijos, dos sussurros, gemidos, sons emitidos
Sem explicarem nada

Charles Burck 



quarta-feira, 12 de setembro de 2018


Ode aos beligerantes



Se fosse só a inquietação dos vulcões e o dinamismo das massas
Eu deixaria chover,
Mas envergo-me a aceitar outros fatos os que eu não tenho
Os que eu não sei e os que fogem à minha compreensão,
Mas sou farol sonoro no meio da escuridão e visto-me de branco e aceno
E as tempestades que eu não convoquei chegam
E inundam as fendas e varrem as soberbas,
As hordas selvagens se aproximaram, ouço os seus cantos,
Os seus hinos e a cor de cada voz,
Quem pensa em fugir delas, congela,
Os corações de pedras procuram os peitos de carnes,
As puras obtenções de um sangue que corra mais do que vaze,
As chinelas púrpuras dos pés magoados aplanam as estradas,
Somos todos um único ser, envolvidos pelo mesmo domus
E a cavalaria chega mais cedo nos tropéis cegos que devastam os jardins,
As células dos cascos salpicam misturadas à poeira os rostos maculados,
O batismo de fogo e lágrimas calaram os bardos,
Na história se perderão os heróis e os covardes, os sangues dos dois se misturarão sob a sombra da mesma bandeira,
E a eternidade jamais explicará a falência dos braços que se separaram após os abraços,
E a unicidade das vozes nos contará dos brilhos perdidos dos olhos,
Os erros de julgamentos e a morte levarão seus entes para crucificação,
E os herdeiros das batalhas arruinadas comerão o pó e os ossos calcinados,
E as velhas guarnições de carnes esquecidas nos lastros dos barcos naufragados,
A discórdia semeará os campos e a morte comerá nas garras das feras
e depois dormirá sobre as ovelhas imoladas,
e sonhará
No chão pisado pelos que vieram dar voz ao tempo,
se calarão ante a precipitação dos deuses,
e das estações
As bestas parirão em todas as estocadas das mandíbulas dos detratores,
E chorarão as orações não ouvidas pelos que sentaram sob os véus de malignas perversidades,
Honrarão os nomes cravejados nos painéis dos purgatórios,
como único ofertório oferendado aos mortos
E as aparições penitentes vindas do caos procurarão novas causas,
Novos corações beligerantes para justificarem as suas armas,
E matarão os mortos mais uma vez e farão filhos sob as covas rasas,
Caminharão pelos campos açodados e anotarão os nomes dos que ainda gemem
E ao que venham insurgentes partirão sem adeus
Um dedo de prosa e dois punhais encravados serão os
 sinal de amistosidade
Um beijo nas faces crispadas e trintas moedas para compensar a perda das suas almas


Charles Burck



Richard Baxter 1966

sábado, 8 de setembro de 2018


O poema colhido quente, na febre, no ato o alimento que o amor oferece
Desenho no chão a giz, uma linha imaginaria para que possas transgredi-la
Pular para o lado da seiva que goza, os olhos que cismam, a febre alta que cola um peito ao outro,
Eu que floresci dos desassossegos e dei frutos nos abandonos,
Quero o corpo descoberto, o cenário que crias no meu imaginário,
O regalo que se inicia na boca, o íntimo aberto ao tudo que revê-las,
O êxtase do silêncio, o fluxo livre da razão que cala
Traço-te na pele os gemidos, mas revelo o nome,
Na fome eterna do amor em forma de versos,
Os dedos que se entrelaçam no esgotamento do tempo,
Quando tudo cala, quando tudo cessa, quando tudo deixa de ser para existir,
No instante seguinte,
De novo



Charles Burck







Talvez a única salvação é nunca ser salvo,
Deixar amadurecer os frutos nos seios,
E come-los mais doces e maduros,
Ser o cenário e o personagem, roubar o enredo
A história?
Não preciso escrevê-la, ela soa sempre em melodias no dia seguinte,
No instante onde penso que me salvei,
Podes dizer ao mundo inteiro que escrevi todos os poemas,
Mas quase todos já estavam prontos, as letras são tuas, as palavras também
Assim fiz desenhos, rabiscos e garranchos, e deixe um lapso do nome,
Dormíamos nus sem os súbitos sonos nas estiagens do prazer
Adocicados lábios são lembranças de curas,
Eu que vivia costurando a pele, sarei,
Podes dizer a todos que me fiz poeta porque eu te amei,
Quando um dia o mundo se desfizer em primaveras sem sonos
Podes sossegar no meu peito e nele ouvir os poemas cantados,
Um a um,
Até que adormeças

 Charles Burck

 



Nada tão silencioso como o tempo quando dormes,
Quando eu preciso decidir as palavras que escrevo,
Quando nem sei se é possível que existam,
Mas há os aromas enfileirados entre arvores de floresta muda,
E as vozes que costuram entre os troncos outros silêncios
Dizem que as coisas tocadas pelo amor ganham vozes


Tal quais os diálogos de sempre vinha a luz cantar sobre nós,
E eu esperava trêmulo que o teu sono cessasse
Para espantar então os meus medos tão barulhentos


Charles Burck



A terra nua, disposta,
Que por vezes desejei louca, a arder
Assim como queimam os corpos, nus, dispostos,
Postos com a indiscrição do desejo,
Fogo nosso
Na mesma sintonia de nossa febre,


Ateei-me fogo como um clarão combinado,
Lua nua, admirada,
Os templos queimados, as cinzas transformadas a cada respirar,
Parecíamos um santuário em chamas
O carmim queimando o dourado, a arte de morrer imolado


Lambíamos as palavras como açúcar queimado
Amor adoçado em saliva
Quando falávamos de tudo
Só falávamos de nós


Charles Burck





Não sei os motivos porque vim,
Mas hoje podemos deitar e contar mentiras sobre quem chegou primeiro
Inventarmos histórias de brincadeiras, uma pátria solenemente tocada no teu seio,
O nascer e por da luz solar nos teus olhos, a esperança pousada sobre uma estrela qualquer,
A mulher que me vê e me diz ver o amor na palma da minha mão,
E faz perguntas difíceis e me deixa colher respostas nos seus lábios
Mas logo me diz - Não torne difíceis as respostas de chegar a mim,
Antes me provoque porém,
Temos jardins nas bordas da cama e vícios de desenhar mapas no corpo, lugares sonhados de viagens tantas,
Onde as flores imperfeitas são dobras nos lençóis de jardins perfeitos
Hoje podemos dormir em novas viagens, mas ao que você partir, dê-me alguns beijos nas costas,
Um destino marcado com dentes e lábios,
Uma assinatura especifica, uma proposta de novo encontro


Charles Burck