No
bolso do paletó guardo mais que a carteira,
Na
gaveta do meio guardo todas as nossas coisas. Os campos que lês, os laços que
abro, as veias dormentes, a luz da lareira. No meio dos sonhos contados guardo
os sons e o frio dos ossos. A pele que liberta a lição. O tempo
Doem-me
as mãos ao escrever, a pungência da noite intercalada na carne o gorjeio dos
corvos a estende a fatalidade como o garrote das fontes,
O
apontar dos dedos, a arte de denunciar os semelhantes, os negros quadros de
lama e de sangue,
Não
dou as costas aos covardes, os que medram no escondido das noites,
Os
que vagam como sombras rentes ao chão,
Chove
em todos os sentidos, esqueço o momento levito na escuridão, pairo sobre os
parvos de raízes entre as pedras,
Todas
as minhas veias resvalam na vibração do universo, na simbiose do homem e dos
astros, nessa força viva que me sustenta as asas,
Quem
és tu que a mim se junta para sonhares as palavras vivas?
Que
compreende o sentido do ser, que estende as frases além de nós,
O
guerreiro assombrado com si, com as coisas que descobre ao fincar a espada no
jardim acima da cabeça
És
tu os que tivestes as pernas e os braços pesados, a cabeça a mergulhada nos
sonhos, o sentido de nadas entres as flores de liz e as algas,
O
que limpou o caminho por baixo do solo adormecido do pensamento, deu ênfases as
línguas, aos palatos, ao som que nasce das paredes que tentavam separar os
mundos
Sinto
que já fui pó, madeira queimada, as chagas filhas da cegueira brumosa
Sou
eu agora que falo a tua voz, o cálice das ninfas, pelos centros, pelos
arredores, pelas distâncias onde apenas os bichos rastejavam,
O onírico
delírio festejado em reais cores, a sufocar o escuro, não quero pensar o que
sei, ainda há tantos nadas a rondar as loucuras,
Armadilhas
plantadas diante de nós, por onde vaga o vento, dizendo que nada sei,
Que
não sei nada
Charles
Burck